Desde aos anos 1960, período das independências africanas, onde vários países do continente africano alcançaram as suas independências do jugo colonial, até finais dos anos 1980, o continente africano contava quase unicamente com regimes autoritários e duros, baseados no sistema de partido único. Poucos foram os sistemas políticos receptivos ao espírito crítico construtivo, contestação e pluralismo político e religioso. Nos nossos dias, verificamos que números são os chefes de Estados africanos que se fixaram e no poder. Eles estão dispostos, a todo custo, a não perderem o controlo do poder político e da sua posição de chefe de Estado e do governo.
A Democracia é definida como sendo o governo do povo pelo povo, geralmente através de representantes eleitos. No mundo moderno, a democracia desenvolveu-se a partir das revoluções americana e francesa. Numa democracia directa, todo o povo se reúne para fazer as leis ou dar instruções aos que exercem funções executivas, por exemplo, em Atenas, no século V a.C. Hoje em dia, a democracia directa é representada sobretudo pela utilização do referendum, como sucede no Reino Unido, na França, na Suíça e nalguns estados dos EUA, (Enciclopédia Universal Multimédia, 1999).
Os conceitos subjacentes à democracia liberal são o direito a um governo eleito e representativo e o direito à liberdade individual. Na prática, um sistema democrático liberal é caracterizado pela existência de instituições representativas baseadas no governo de uma maioria eleita por eleições livres disputadas por vários partidos políticos; pela responsabilidade do governo perante o eleitorado; pela liberdade de expressão, de reunião e do indivíduo, pela garantia de um sistema judicial independente; e pelas limitações do poder do governo.
Um sistema político só pode ser considerado verdadeiramente democrático se o governo puder ser pacificamente demitido por uma decisão da maioria do povo. Há poucos países hoje em dia que não afirmem ser democráticos, mas com base neste critério, nem todos o são verdadeiramente.
A democracia política é apenas uma das vertentes da democracia, uma vez que a democracia é algo oolítico. A história dos países democráticos já provou que um Estado verdadeiramente democrático não pode consistir apenas numa estrutura política democrática. Tem de ser capaz de formar pedagogicamente a opinião pública, para que seja efectiva a participação de todos os cidadãos no controlo das decisões dos órgãos do poder político. Deve fazer vigorar uma democracia social e deve também incentivar a criação de uma democracia económica.
O começo da década 1990 coincidiu com o fim da Guerra-fria e a consequente bipolarização do mundo. O resultado deste processo foi a expansão do modelo democrático liberal em vários Estados que antes tinham adoptado o socialismo como modelo de desenvolvimento. Houve uma descida progressiva da Ajuda internacional ao desenvolvimento; houve a decadência da tutela da geopolítica e geoestratégia e uma redução da soberania de muitos países devido a dívida externa e a exigência da democracia a troco de empréstimos por parte das instituições financeiras. Os países africanos não puderam escapar deste contexto e destas imposições.
Como resultado deste contexto, verificou-se uma onda de democratização que arrastou consigo 38 países africanos. Mas, hoje, quando se faz o balanço desta onda de democratização, o resultado é pobre e deixa muito a desejar. Ora vejamos: dos 38 Estados africanos que optaram pela transição ao regime democrático liberal, 4 abortaram antes das eleições que tinham sido marcadas; 20 presidentes mantiveram-se no poder apesar das eleições terem ocorrido e os resultados lhes serem desfavoráveis; houve 14 mudanças presidenciais, mas não pacíficas, das quais 4 foram a restauração de regimes autoritários, 2 foram o regresso de antigos presidentes; houve 3 transições de regime e de presidente que foram de modo pacífico e 5 democracias foram consolidadas, com destaque para Moçambique.
Entre 2000 – 2008, o Continente Africano experimentou poucos avanços em matéria de democratização e implementação dos pressupostos democráticos nos modelos de governação, prova disso são os casos de resistência democrática, golpes de Estados e violência política para se manter no poder.
Em muitos Estados Africano, o Aparelho do estado passou a ser o único meio de acumulação de bens e riqueza e os presidentes em exercício esforçam-se a todo custo por regular, restringir e limitar a competição política de outros membros e outras forças que tentam ascender ao poder de forma pacífica e democrática. Para agravar, o despotismo e nepotismo fazem parte do modus operandi da maioria destes líderes. Perante este cenário, muitos são os analistas que defendem que o modelo democrático liberal está desajustado à realidade africana, ou seja, é uma cópia que não se adequa a realidade dos países africanos.
Se olharmos para muitos países do continente africano abaixo do Sahara, verificamos que são países onde a cultura bantu é dominantes. É sabido que o modelo bantu de acesso, aquisição e manutenção do poder é o modelo tradicional de sistema político.
Segundo Ball (1999:34-39), o modelo tradicional é o mais antigo e existiu em quase todas sociedades e, até hoje, influencia os sistemas políticos actuais. Neste modelo, o poder é controlado por uma aristocracia dominante. A legitimidade é baseada em costumes; há uma base axiológica tradicional e princípios religiosos. O regime de governação e a orientação do regime é extremamente conservador. As reformas e transformações sociais, económicas e políticas são raras e quando acontecem, procuram assegurar a supremacia social, económica, política e religiosa das elites aristocráticas. Verifica-se uma participação política de massa muito fraca. Os antepassados e os costumes têm grande relevância na governação e condução dos destinos da comunidade. Este modelo de governação tende a cair quando as forças da modernização, instrução, globalização entram bem no seu seio da comunidade. O acesso ao poder é de forma hereditária.
Todos esses elementos verificam-se em quase todos os países africanos que tentaram enveredar pela transição ao modelo democrático desde o início da década 1990. Os chefes de Estado e de governo são relutantes em ceder o poder facilmente, porque, muitos deles, acham que os outros podem “vender o país” a estranhos, sobretudo ao Ocidente. O problema que para uns está no desajustamento do modelo da democracia liberal à realidade africana, para outros, o problema está nas lideranças que se apegaram ao poder e têm medo de serem responsabilizados pelos nacionais e pela comunidade internacional pela governação danosa.
A solução para resolver esse problema pode ser a Bantocracia ou a chamada Democracia Africana, democracia essa assente nos valores bantu, onde há um líder que é o Ansião, detentor do saber, dos costumes, serve aos membros da comunidade, é o representantes legítimo da tradição e dos antepassados, é assessorado por um grupo de anciões e sábios e escuta o que o povo diz e quer.
O líder, na Bantocracia, detém o poder, não o exerce o mesmo para o seu benefício próprio, mas sim em benefício da comunidade. Ele é assessorado por um grupo de Ansião que o ajudam na tomada de decisão e as decisões são colegiais, tendo sempre em consideração as ansiedades do povo. O povo tem sempre uma palavra a dizer, visto que as decisões são lhes apresentadas e consultadas. Aparentemente, pode parecer que a Bantocracia é antidemocrática, mas o poder reside no povo e todas as decisões são tomas tendo em conta o mes mo povo.
Para terminar, voltando aos líderes africanos que a todo custo querem se manter no poder, resta dizer que a grande sorte dos Estados do continente africano é que esses dinossauros no poder estão a ficar muito poucos. Sendo assim, há lugar para uma esperança, se bem que a experiência aconselha e manda ser prudente.
REFERÊNCIAS
Ball, Allan (1994), Modern Ppolitics & Government, 5ª Edição, MacMillan Press, Londres.
Combonianos, Missionários (2007) Revista Missionária Além – Mar, Nº 562, Ano LI, Lisboa.
Enciclopédia Universal Multimédia (1997) Texto Editora, CD-ROM, Lisboa
Lopez, António José (2001) História da África Contemporâne: De Nkrumah a Mandela, 2ª Edição, Edições Mundo Negro, Madrid.
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